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Revolução silenciosa nos hospitais de pediatria do Rio e em seis estados do país

Matéria do O Globo.

Presidente da Saúde Criança, a médica Vera Cordeiro fala sobre a instituição/Eduardo Uzal

RIO – Há 18 anos, começava uma revolução silenciosa no setor de pediatria do Hospital da Lagoa, na Zona Sul do Rio de Janeiro. Ali, como na maioria das unidades de saúde do país, era constante o ciclo de internação e reinternação de crianças após receber a alta hospitalar, já que suas famílias não possuem estrutura básica para continuar o tratamento em casa.

As constantes reinternações de pacientes, muitas vezes em estado mais grave ainda, fez com que médicos e enfermeiros da instituição, mais representantes da sociedade, se mobilizassem para acabar com esse círculo vicioso. À frente do movimento, a médica Vera Cordeiro, clínica geral com especialização em psicossomática, fundou a Associação Saúde Criança, uma organização não-governamental que tem como objetivo principal transformar a vida de crianças e famílias em situação de risco.

– Estávamos enxugando gelo. Só o ato médico, de tratar a doença, não tinha significado, com o processo de internação e reinternação do mesmo paciente diversas vezes. Percebemos que aquilo era apenas a ponta do iceberg e que precisávamos mudar as condições socioeconômicas das familiares dos pacientes. Passamos a olhar a saúde de maneira integrada, verificando as condições sociais das famílias – diz Vera Cordeiro, sentada num banco de praça no pátio da entidade, durante o rápido intervalo entre uma reunião e outra com os diversos apoiadores do projeto.

Plano de Ação Familiar

De acordo com a fundadora e superintendente-geral da instituição, ao quebrar o paradigma de só tratar a doença, foi possível proporcionar uma melhoria integral das condições sociais das famílias e garantir o rompimento do ciclo vicioso miséria/doença/internação/reinternação/morte. Para que isso ocorresse, foi criada uma metodologia pioneira – o Plano de Ação Familiar (PAF), englobando cinco eixos – saúde, profissionalização, moradia, educação e cidadania – e atuando junto a todos os membros da família, e não apenas no tratamento à criança doente.

Para ser atendida pela Associação, a família deve passar primeiro por uma triagem no hospital onde a criança está sendo atendida. Segundo os critérios de seleção, é preciso estar abaixo da linha da pobreza e mostrar comprometimento para seguir as metas traçadas pelo PAF. Passados 18 anos, a ONG atendeu a mais de 13 mil pessoas nos 18 anos de atividade.

– Durante todo o período de aplicação da metodologia – a duração média é de dois anos – a família é acompanhada por uma equipe de profissionais que realizam a checagem periódica das melhorias atingidas. As famílias recebem gratuitamente alimentos, medicamentos, equipamentos médicos, aconselhamento nutricional e fisiológico, além de apoio psiquiátrico. São ministrados cursos onde se ensinam noções de higiene, planejamento familiar, os males dos abusos de substâncias, violência, acidentes domésticos e desenvolvimento da criança, além de cursos profissionalizantes visando a geração de renda das famílias – explica Vera.

Superação

Mãe da menina Ana Karla, Wanderléia Pereira da Silva afirma que a Saúde Criança mudou a vida da famíliaO histórico hospitalar da menina Ana karla, de 3 anos e meio, é um exemplo típico da atuação da organização Saúde Criança. Conforme a auxiliar de serviços gerais desempregada e mãe de Ana, Wanderléia Pereira da Silva, a criança nasceu prematura, ficando internada por cerca de quatro meses num hospital da Zona Oeste do Rio de Janeiro. Ao retornar para casa, pegou uma pneumonia e teve que ser internada novamente, desta vez no Hospital Miguel Couto, na Zona Sul da cidade.

Ali, a criança chegou a ser internada na Unidade de Terapia Intensiva, sendo transferida para a pediatria do Hospital da Lagoa, após ter sido constatado que também tinha hidrocefalia. Aqui, além de tratar da filha, Wanderléia também passou a receber assistência da Saúde e Criança.

– O primeiro ano da minha filha foi muito difícil. Ao conhecer a entidade fui acolhida por eles. Passei a receber cesta básica, remédios e até me ajudaram a construir a minha casa. Desde que cheguei aqui, minha filha nunca mais foi internada. Agora fiz um curso de vigilante e espero em breve obter um emprego – conta a mãe da menina Ana Karla.

São incontáveis as histórias de superação, tanto na associação quanto em todas as instituições que integram a Rede Saúde Criança, que funciona, na sua maioria, graças ao trabalho de centenas de voluntários e apoiadores. Hoje, só na Associação Saúde Criança, na Lagoa, atuam cerca de 140 voluntários que auxiliam os 38 funcionários no atendimento de 250 famílias e 850 crianças e adolescentes. Vera Cordeiro, no entanto, acredita que já são cerca de 800 voluntários em todo o país.

Voluntária, Ester Pereira Pontes, é hoje vice-presidente da Associação Repartir no Hospital Jesus

Uma dessas voluntárias é a advogada aposentada Esther Pereira Pontes, atual vice-presidente da Repartir – Associação de Apoio às Crianças do Hospital Municipal Jesus, em Vila Isabel, na Zona Norte do Rio. Criada há sete anos, a Repartir é ligada à Rede Saúde Criança e tem no trabalho voluntariado a sua força motriz para auxiliar as crianças do hospital pediátrico.

– A carência das famílias que internam seus filhos aqui na unidade é muito grande. Muitos não têm o que comer em casa, às condições de vida são péssimas. Cabe a nós tentar ajudar no que é possível. Porém, também as nossas limitações são grandes. Temos que sempre realizar campanhas de captação de recursos para atender às necessidades dessas pessoas – diz Esther, que conta com o apoio e a colaboração dos moradores e empresariado da região.

A Rede Saúde e Criança, ao longo desses 18 anos, cresceu e se multiplicou. Hoje, são 23 instituições em seis estados . Neste período, a instituição conquistou uma série de prêmios nacionais e internacionais, na área do empreendedorismo e inovação, e de atenção à saúde familiar. O Plano de Ação Familiar foi adotado pela prefeitura de Belo Horizonte, por meio de um termo de cooperação, além de ser criado, em Nova York, o “Brazil Child Health”, centro de referência e difusão do modelo Rede Saúde Criança e que auxilia na captação de recursos.

Uma resposta to “Revolução silenciosa nos hospitais de pediatria do Rio e em seis estados do país”

  1. O sucesso do mundo é psicológico…

    A tremedeira no meio da noite das crianças com frio e fome, ecoa nos terremotos pelos cantos do país derrubando casas, muros e paredes…….

  2. Wanderleia Silva disse:

    Eu wanderleia pereira da silva, tive um otimo tratamento, tanto pelo hospital quando pela ong Renascer . Hoje eu trabalho em duas empresas de vigilancia e minha filha Ana Karla esta cada vez melhor, ela ja estuda e esta na segunda serie. Obrigada a todos que me ajudaram em um momento muito dificil de nossas vidas.

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